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Sobre o passamento do santo pai

Texto Original

De transitu sancti patris

Caput CLXII - Quomodo hortatus est fratres et benedixit in fine.

 

214 
1 In fine hominis, ait sapiens, denudatio operum illius (cfr. Sir 11,29), quod in sancto isto gloriose cernimus esse completum. 
2 Qui mandatorum Dei viam mentis alacritate percurrens (cfr. Ps 118,32), per omnium virtutum gradus ad summa pervenit, et velut ductile opus, sub multiplicis tribulationis malleo ad perfectionem adductus, omnis consummationis vidit finem (cfr. Ps 118,96). 
3 Tunc enim magis eius mirifica opera colluxerunt, et divinum fuisse omne quod vixit, veritatis iudicio (cfr. Ps 110,7) fulsit, cum vitae mortalis calcatis illecebris, liber evasit ad superos. 
4 Nam mundo vivere (cfr. Gal 2,20) duxit opprobrium, dilexit suos in finem (cfr. Ioa 13,1), mortem cantando suscepit. 
5 Cum enim ad dies iam propinquaret extremos, quibus, finibili luce subtracta, lux perpetua (cfr. 4Esd 2,35) succedebat, virtutis exemplo monstravit, quod nihil commune illi erat cum mundo. 
6 Confectus namque infirmitate illa tam gravi, quae omni languori conclusit, super nudam humum (cfr. Is 14,1) se nudum fecit deponi, ut hora illa extrema, in qua poterat adhuc hostis irasci, ‘nudus luctaretur cum nudo’. 
7 Triumphum revera exspectabat intrepidus, et consertis manibus iustitiae complectebatur coronam (cfr. 2Tim 4,8). 
8 Positus sic in terra (cfr. Iob 20,4), saccina veste deposita, faciem solito levavit ad caelum (cfr. Iob 11,15), et intendens illi gloriae (cfr. Iob 11,5) totus, manu sinistra dextri lateris vulnus, ne videretur, obtexit. 
9 Et ait ad fratres: “Ego quod meum est feci (cfr. 3Re 19,20); quod vestrum est, Christus edoceat (cfr. Eph 4,21)!”.

 

215 
1 Videntes haec filii producunt rivulos lacrimarum, et de intimis longa trahentes suspiria, ni-mio dolori compatiendo succumbunt. 
2 Interea sopitis utcumque singultibus, guardianus eius, qui votum sancti divina verius inspiratione cognovit, festinus surrexit et acceptam cum femoralibus tunicam saccinamque cappellulam, dixit ad patrem: 
3 “Tunicam istam et femoralia cum cappellula, obedientiae sanctae mandato, a me tibi accommodatam cognoveris! 
4 Sed, ut scias te nihil proprietatis in illis habere, dandi haec alicui omnem tibi aufero potestatem”. 
5 Gaudet sanctus et iubilat prae laetitia cordis (cfr. Cant 3,11), quoniam fidem tenuisse dominae paupertati usque in finem se videt. 
6 Fecerat enim haec omnia paupertatis zelo, ut nec habitum quidem proprium in fine vellet habere, sed quasi ab altero commodatum. 
7 Cappellulam vero saccinam portabat in capite, ut cicatrices contegeret pro sanitate oculorum susceptas, cui satis necessarium erat pileum cuiusvis pretiosae lanae suavitate lenissimum.

 

216 
1 Levat post haec sanctus palmas ad caelum (cfr. 2Par 6,13), et Christum suum magnificat, quod iam exoneratus omnibus, liber vadit ad ipsum. 
2 Verum ut ostenderet se Dei sui Christi verum imitatorem (cfr. 1Cor 4,16) in omnibus, fratres et filios, quos dilexerat a principio, in finem dilexit eos (cfr. Ioa 13,1). 
3 Fecit enim fratres omnes assistentes ibidem ad se vocari, et verbis consolatoriis (cfr. Zac 1,13) eos pro sua morte demulcens, paterno affectu ad divinum est hortatus amorem. 
4 De patientia et paupertate servanda sermonem protraxit, caeteris institutis sanctum Evangelium anteponens. 
5 Circumsedentibus vero omnibus fratribus, extendit super eos dexteram suam, et incipiens a vicario suo capitibus singulorum imposuit (cfr. Gen 48,14): 
6 “Valete”, inquit, “filii omnes, in timore Domini (cfr. Act 9,31) et permanete in ipso semper! 7 Et quoniam futura tentatio et tribulatio (cfr. Sir 27,6) appropinquat, felices qui perseverabunt in his quae coeperunt. 
8 Ego enim ad Deum propero, cuius gratiae vos omnes commendo”; 
9 benedixitque in illis qui erant ibi, etiam omnibus fratribus, qui ubique conversabantur in mundo (cfr. 2Cor 1,12), et qui venturi erant post ipsos, usque in finem saeculi saeculorum (cfr. Dan 7,18). 
10 Nullus sibi hanc benedictionem usurpet quam pro absentibus in praesentibus promulgavit; ut alibi scripta est aliquid insonuit speciale, sed potius ad officium detorquendum.

Texto Traduzido

De transitu sancti patris

Capítulo 162 - Como exortou e abençoou os irmãos no fim.

 

214 
1 No fim do homem - diz o Sábio - suas obras serão desnudadas (cfr. Eclo 11,29). 
2 Neste santo vemos que isso se realizou por completo, e gloriosamente. Ele percorreu com alegria da mente o caminho dos mandamentos de Deus, chegou ao alto passando pelos degraus de todas as virtudes e viu o fim de toda consumação como uma obra amoldável, aperfeiçoada pelo martelo das múltiplas tribulações. 
3 Quando partiu livre para os céus, pisando as glórias desta vida mortal, resplandeceram mais as suas obras admiráveis, e ficou provado pelo juízo da verdade que tudo que tinha vivido era divino. 
4 Achou que viver para o mundo era um opróbrio, amou os seus até o fim e recebeu a morte cantando. 
5 Sentindo já próximo seus últimos dias, em que a luz perpétua substituiria a luz que se acaba, demonstrou pelo exemplo de sua virtude que não tinha nada em comum com o mundo. 
6 Prostrado pela doença grave que encerrou todos os seus sofrimentos, fez com que o colocassem nu sobre a terra nua, para que, naquela hora extrema em que ainda podia enraivecer o inimigo, estivesse preparado para lutar nu contra o adversário nu. 
7 Na verdade esperava intrepidamente o triunfo e já apertava em suas mãos a coroa da justiça. 
8 Assim, posto no chão, sem a sua roupa de saco, voltou o rosto para o céu como costumava e, todo concentrado naquela glória, cobriu a chaga do lado direito com a mão esquerda, para que não a vissem. 
9 E disse aos frades: “Eu fiz a minha parte; que Cristo vos ensine a cumprir a vossa!”

 

215 
1 Vendo isso, os filhos sucumbiram à dor imensa da compaixão, soltando rios de lágrimas e dando longos suspiros. 
2 O seu guardião, contendo os soluços e adivinhando por inspiração divina o que o santo queria, levantou-se, foi correndo buscar uma calça, o hábito de saco e o capuz, e disse ao pai: 
3 “Fica sabendo que te empresto, em virtude da obediência, este hábito, as calças e o capuz! 
4 Mas para saberes que não tens nenhum direito de propriedade, tiro-te o poder de dá-los a quem quer que seja”. 
5 O santo se alegrou e se rejubilou de alegria do coração, vendo que tinha mantido a fidelidade para com a Senhora Pobreza até o fim. 
6 Fizera tudo isso por zelo da pobreza, a ponto de não querer ter no fim nem o hábito próprio mas como emprestado por outro. 
7 Usara na cabeça o capuz de saco para esconder as cicatrizes da doença dos olhos, quando teria necessidade de um gorro de lã cara, que fosse bem macio.

 

216 
1 Depois disso, o santo levantou as mãos para o céu e louvou a Cristo porque, livre de tudo, já estava indo ao seu encontro. 
2 Mas, para demonstrar que era um verdadeiro imitador do Cristo, seu Deus, em todas as coisas, amou até o fim os frades e filhos, a quem amara desde o começo. 
3 Pois fez chamar todos os irmãos presentes e, aclamando-os com palavras de consolação, por sua morte, exortou-os com afeto de pai ao amor de Deus. 
4 Falou também sobre a observância da paciência e da pobreza, dizendo que o santo Evangelho era mais importante do que todas as instituições. 
5 Estando todos os frades sentados ao seu redor, estendeu sobre eles a sua destra e, começando por seu vigário, a impôs sobre a cabeça de cada um. 
6 E disse: “Filhos todos, adeus no temor do Senhor! Permanecei sempre nele! 
7 E como a tentação e a tribulação estão para chegar, felizes os que perseverarem no que começaram. 
8 Eu vou para Deus, a cuja graça recomendo-vos todos”. 
9 Nos que estavam presentes, abençoou a todos os frades que estavam por todo o mundo e os que haveriam de vir depois deles, até o fim dos séculos dos séculos. 
10 Que ninguém usurpe para si mesmo essa bênção que, nos presentes, deu aos ausentes. Assim como se acha escrita em outro lugar parece ter algo de especial, mas isso é um desvirtuamento.