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Capítulo 82

Texto Original

Caput LXXXII

Quomodo diabolus vocans eum de luxuria tentavit, et qualiter sanctus superavit.

 

116 
1 In eremo fratrum de Sartiano malignus ille, qui semper profectibus invidet filiorum Dei (cfr. Rom 5,2) tale quiddam erga sanctum praesumpsit. 
2 Videns namque sanctum santificari adhuc (cfr. Apoc 22,11), nec pro hesterno hodiernum intermittere lucrum (cfr. Iac 4,13), cum nocte quadam ad orationem vacaret (cfr. 1Cor 7,5) in cellula, vocavit eum ter (cfr. 1Re 3,8) dicens: “Francisce, Francisce, Francisce”. 
3 Qui respondit dicens: “Quid vis (cfr. Mar 9,37; Mat 20,21)?”. 
4 Et ille: “Nullus est in mundo peccator, cui, si conversus fuerit (cfr. Ez 33,9), non indulgeat Dominus; sed quicumque semetipsum poenitentia dura necaverit, in perpetuum misericordiam non inveniet (cfr. Dan 3,39)”. 
5 Statim sanctus per revelationem cognovit hostis astutiam (cfr. Gal 1,12; Sir 1,6), quomodo nisus fuerit eum ad tepida revocare. 
6 Quid ergo? Non destitit inimicus aliud inferre certamen. 
7 Cernens enim quod laqueum sic occultare non potuit, alium laqueum (cfr. Ps 139,6) praeparat, carnis videlicet incentivum. 
8 Frustra tamen, quoniam qui spiritus deprehendit versutiam, carne sophisticari non potuit. 
9 Immittit ergo in eum diabolus gravissimam tentationem luxuriae. 
10 At beatus pater, statim ut percipit, veste deposita, chordula durissime se verberat, dicens: “Eia, frater asine, sic te manere decet, sic subire flagellum. 
11 Tunica religionis est, furari non licet; si quo vis pergere, perge (cfr. Is 40,4; 1Re 30,13)!”.

 

117 
1 Videns autem propter disciplinas tentationem non discedere, cum tamen iam livoribus membra cuncta pinxisset, aperta cellula, foras exiit (cfr. Mar 14,68) in hortum, et in magnam nivem demersit se nudum. 
2 Accipiens autem nivem plenis conficit manibus, et ex ea in modum pilae septem glebas compingit (cfr. Iob 38,38). 
3 Quas sibi proponens, coepit alloqui corpus: 
“Ecce”, inquit, “haec maior uxor tua est; porro istae quattuor duo sunt filii, et duae filiae tuae; reliquae duae servus sunt et ancilla, quos ad serviendum habere oportet. 
4 Et festina”, inquit, omnes induere, quoniam frigore moriuntur. 
5 Si autem eorum multiplex sollicitudo molestat, uni Domino sollicitus servi (cfr. Mat 4,10)!”. 
6 Illico diabolus confusus abscedit, sanctusque in cellam revertitur glorificans Deum (cfr. Luc 2,20). 
7 Quidam spiritualis frater, qui tunc vacabat orationi (cfr. 1Cor 7,5), luna clarius incedente (cfr. Iob 31,36), totum intuitus est. 
8 Sanctus autem, comperto postomodum quod ille se in nocte vidisset, dolens multum, praecepit ut rem nulli detergeret, donec in saeculo viveret (cfr. Tit 2,12).

Texto Traduzido

Caput LXXXII

Como diabo, chamando-o, tentou-o na luxúria, e como o santo superou.

 

116 
1 No eremitério dos frades em Sarciano, aquele malvado que sempre tem inveja dos aproveitamentos dos filhos de Deus preparou para o santo o que vamos narrar. 
2 Vendo que o santo ainda estava se santificando mais e que não descuidava do lucro de hoje pelo de ontem, numa noite em que estava em oração no seu cubículo, chamou-o três vezes dizendo: “Francisco, Francisco, Francisco!” 
3 Ele respondeu dizendo: “Que queres?” 
4 E ele: “Não há pecador nenhum no mundo a quem o Senhor não perdoe, se se converter. Mas nunca vai obter misericórdia quem se matar por uma dura penitência”. 
5 O santo logo conheceu, por uma revelação, a astúcia do inimigo, que estava procurando fazer com que voltasse para uma vida morna. 
6 E então? O inimigo não desanimou e partiu para um novo ataque. 
7 Vendo que não tinha conseguido esconder-se nessa armadilha, armou outra, uma tentação da carne. 
8 Em vão, porém, porque aquele que tinha descoberto a malícia do espírito não pôde ser enganado pela carne. 
9 Então o demônio lhe aprontou uma gravíssima tentação de luxúria. 
10 Mas o bem-aventurado pai, logo que percebeu, tirou a roupa e se açoitou duramente com uma corda, dizendo: “Vamos, irmão asno, é assim que te deves comportar, é assim que tens de ser castigado. 
11 Esta é a túnica da ordem e não pode ser roubada. Se estás querendo ir para outro lugar, que te vás!”

 

117 
1 Quando viu que a tentação não ia embora nem com as chicotadas, apesar de já estar com o corpo todo marcado de sangue, abriu a cela, saiu para fora no bosque e mergulhou, despido, na neve alta. 
2 Depois encheu as mãos de neve e fez com ela sete torrões em forma de bolas. 
3 Colocou-os à sua frente e começou a dizer a seu corpo: - “Essa maior é tua mulher, essas outras quatro são teus dois filhos e duas filhas, as outras duas são o servo e a criada que precisas ter para o teu serviço. 
4 Apressa-te a vestir a todos, que estão morrendo de frio. 
5 Mas, se te parecer molesto todo esse cuidado por eles, tens que servir só ao Senhor, decididamente!” 
6 O diabo foi logo embora confundido e o santo voltou para a cela glorificando a Deus. 
7 Um frade espiritual, que estava entregue à oração nessa hora, viu tudo isso claramente à luz da lua que passava. 
8 Mas o santo ficou muito aborrecido quando soube que ele o tinha visto de noite, e lhe proibiu que o contasse a quem quer que fosse, enquanto ele vivesse neste mundo.