Selecione

Capítulo 30

Texto Original

Caput XXX

De praesepio quod fecit in die natalis Domini.

 

84. 
1 Summa eius intentio, praecipuum desiderium, supremumque propositum eius erat sanctum Evangelium in omnibus et per omnia observare ac perfecte omni vigilantia, omni studio, toto desiderio mentis, toto cordis fervore, “Domini nostri Iesu Christi doctrinam sequi et vestigia” imitari. 
2 Recordabatur assidua meditatione verborum eius et sagacissima consideratione ipsius opera recolebat. 
3 Praecipue incarnationis humilitas et charitas passionis ita eius memoriam occupabant, ut vix vellet aliud cogitare. 
4 Memorandum proinde ac reverenti memoria recolendum quod tertio anno ante gloriosi obitus sui diem apud castrum quod Graecium dicitur, fecit in die natalis Domini nostri Iesu Christi. 
5 Erat in terra illa vir (cfr. Iob 1,1) quidam nomine Ioannes, bonae famae (cfr. Phip 4,8) sed melioris vitae, quem beatus Franciscus amore praecipuo diligebat, quoniam cum in terra sua nobilis et honorabilis plurimum exstitisset, carnis nobilitate calcata, nobilitatem animi est secutus. 
6 Hunc vero beatus Franciscus, sicut saepe solebat, fere per quindecim dies ante nativitatem Domini fecit ad se vocari 
7 et dixit ei: “Si desideras, ut apud Graecium praesentem festivitatem Domini celebremus, festina praecedere, et quae tibi dico, praepara diligenter (cfr. Prov 24,27). 
8 Volo enim illius pueri memoriam agere, qui in Bethlehem natus est (cfr. Mat 2,1.2), et infantilium necessitatum eius incommoda, quomodo in praesepio reclinatus (cfr. Luc 2,7) et quomodo, adstante bove atque asino, supra foenum positus exstitit, utcumque corporeis oculis previdere”. 
9 Quod audiens vir bonus atque fidelis cucurrit citius (cfr. Ioa 20,4), et omnia in praedicto loco, quae sanctus dixerat, praeparavit.

 

85. 
1 Appropinquavit autem dies laetititae, tempus exsultationis advenit. 
2 E pluribus locis vocati sunt fratres: viri et mulieres terrae illius, secundum posse suum, exsultantibus animis cereos et faces praeparant ad illuminandam noctem, quae scintillanti sidere dies omnes illuminavit et annos. 
3 Venit denique sanctus Dei et inveniens omnia praeparata, vidit et gavisus est (cfr. Ioa 8,56). 
4 Et quidem praeparatur praesepium, apportatur foenum, bos et asinus adducuntur. 
5 Honoratur ibi simplicitas, exaltatur paupertas, humilitas commendatur et quasi nova Bethlehem de Graecio facta est. 
6 Illuminatur nox ut dies (cfr. Ps 138,12), et hominibus atque animalibus deliciosa exstitit. 
7 Adveniunt populi et ad novum mysterium novis gaudiis adlaetantur. 
8 Personat silva voces et iubilantibus rupes respondent. 
9 Cantant fratres, Domino laudes debitas persolventes, et tota nox iubilatione resultat. 
10 Stat sanctus Dei (cfr. Mar 1,24) coram praesepio, suspiriis plenus, pietate contritus et mirabili gaudio superfusus. 
11 Celebrantur missarum solemnia supra praesepe et nova fruitur consolatione sacerdos.

 

86. 
1 Induitur sanctus Dei leviticis ornamentis, quia levita erat, et voce sonora sanctum Evangelium cantat. 
2 Et quidem vox eius, ‘vox vehemens, vox dulcis (cfr. Cant 2,14), vox clara, voxque sonora’, cunctos invitans ad praemia summa. 
3 Praedicat deinde populo circumstanti et de nativitate pauperis Regis et Bethlehem parvula civitate melliflua ructat. 
4 Saepe quoque, cum vellet Christum “Iesum” nominare, amore flagrans nimio, eum “puerum de Bethlehem” nuncupabat, et more balantis ovis “Bethlehem” dicens, os suum voce sed magis dulci affectione totum implebat. 
5 Labia sua etiam, cum “puerum de Bethlehem” vel “Iesum” nominaret, quasi lambebat lingua, felici palato degustans et deglutiens dulcedinem verbi huius. 
6 Multiplicantur ibi dona Omnipotentis et a quodam viro virtutis (cfr. 1Mac 5,50) mirabilis visio cernitur. 
7 Videbat enim in praesepio puerulum unum iacentem exanimem, ad quem videbat accedere sanctum Dei et eumdem puerum quasi a somni sopore suscitare. 
8 Nec inconveniens visio ista, cum puer Iesus in multorum cordibus oblivioni fuerit datus (cfr. Ps 30,13), in quibus, ipsius gratia faciente, per servum suum sanctum Franciscum resuscitatus est et impressus memoriae diligenti. 
9 Finiuntur denique solemnes excubiae et unusquisque cum gaudio ad propria remeavit.

 

87. 
1 Conservatur foenum in praesepio positum, ut per ipsum iumenta et animalia salva faciat Dominus quemadmodum multiplicavit misericordiam (cfr. Ps 35,7.8) suam sanctam. 
2 Et revera sic actum est, ut animalia multa, diversos morbos habentia, per cicumadiacentem regionem, manducantia de hoc foeno, a suis sint aegritudinibus liberata. 
3 Immo et mulieres, partu gravi ac longo laborantes, de praedicto foeno sibi superimponentes, partu pariunt salutari: atque a diversis cladibus utriusque sexus concursus desideratam ibidem obtinent sanitatem. 
4 Consecratus est denique locus praesepii templum Domino (cfr. 3Re 8,63), et in honorem beatissimi patris Francisci supra praesepe altare construitur et ecclesia dedicatur, 
5 ut ubi animalia quandoque foeni pabulum comederunt (cfr. Dan 5,21), ibi de caetero ad sanitatem animae ac corporis manducent homines carnes agni immaculati et incontaminati Iesu Christi Domini nostri (cfr. 1Pet 1,19; 1Cor 1,10), 
6 qui summa et ineffabilli charitate dedit seipsum nobis (cfr. Tit 2,14), cum Patre ac Spiritu sancto vivens et regnans Deus aeternaliter gloriosus per cuncta saecula saeculorum. Amen. Alleluia (cfr. Apoc 1,18; 19,4), Alleluia. 
Explicit primum opus de vita et actibus beati Francisci.

Texto Traduzido

Caput XXX

Do presépio que fez no dia de Natal do Senhor.

 

84. 
1 Sua maior aspiração, seu mais vivo desejo e mais elevado propósito era observar o Evangelho em tudo e por tudo, imitando com perfeição, atenção, esforço, dedicação e fervor os “passos de Nosso Senhor Jesus Cristo no seguimento de sua doutrina”. 
2 Estava sempre meditando em suas palavras e recordava seus atos com muita inteligência. 
3 Gostava tanto de lembrar a humildade de sua encarnação e o amor de sua paixão, que nem queria pensar em outras coisas. 
4 Precisamos recordar com todo respeito e admiração o que fez no dia de Natal, no povoado de Grécio, três anos antes de sua gloriosa morte. 
5 Havia nesse lugar um homem chamado João, de boa fama e vida ainda melhor, a quem São Francisco tinha especial amizade porque, sendo muito nobre e honrado em sua terra, desprezava a nobreza humana para seguir a nobreza de espírito. 
Uns quinze dias antes do Natal, São Francisco mandou chamá-lo, como costumava fazer, 
7 e disse: “Se você quiser que celebremos o Natal em Grécio, é bom começar a preparar diligentemente e desde já o que eu vou dizer. 
8 Quero lembrar o menino que nasceu em Belém, os apertos que passou, como foi posto num presépio, e contemplar com os próprios olhos como ficou em cima da palha, entre o boi e o burro”. 
9 Ouvindo isso, o homem bom e fiel correu imediatamente e preparou no lugar indicado o que o santo tinha pedido.

 

85. 
1 E veio o dia da alegria, chegou o tempo da exultação. 
2 De muitos lugares foram chamados os irmãos. Homens e mulheres do lugar, coração em festa, prepararam como puderam tochas e archotes para iluminar a noite que tinha iluminado todos os dias e anos com sua brilhante estrela. 
3 Por fim, chegou o santo e, vendo tudo preparado, ficou satisfeito. 
4 Fizeram um presépio, trouxeram palha, um boi e um burro. 
5 Grécio tornou-se uma nova Belém, honrando a simplicidade, louvando a pobreza e recomendando a humildade. 
6 A noite ficou iluminada como o dia: era um encanto para os homens e para os animais. 
7 O povo foi chegando e se alegrou com o mistério renovado em uma alegria toda nova. 
8 O bosque ressoava com as vozes que ecoavam nos morros. 
9 Os frades cantavam, dando os devidos louvores ao Senhor e a noite inteira se rejubilava. 
10 O santo estava diante do presépio a suspirar, cheio de piedade e de alegria. 
11 A missa foi celebrada ali mesmo no presépio, e o sacerdote sentiu uma consolação jamais experimentada.

 

86. 
1 O santo vestiu dalmática, porque era diácono, e cantou com voz sonora o santo Evangelho. 
2 De fato, era “uma voz forte, doce, clara e sonora”, convidando a todos às alegrias eternas. 
3 Depois pregou ao povo presente, dizendo coisas doces como o mel sobre o nascimento do Rei pobre e sobre a pequena cidade de Belém. 
4 Muitas vezes, quando queria nomear Cristo Jesus, chamava-o também com muito amor de “menino de Belém”, e pronunciava a palavra “Belém” como o balido de uma ovelha, enchendo a boca com a voz e mais ainda com a doce afeição. 
5 Também estalava a língua quando falava “menino de Belém” ou “Jesus”, saboreando a doçura dessas palavras. 
6 Multiplicaram-se nesse lugar os favores do Todo-Poderoso, e um homem de virtude teve uma visão admirável. 
7 Pareceu-lhe ver deitado no presépio um bebê sem vida, que despertou quando o santo chegou perto. 
8 E essa visão veio muito a propósito, porque o menino Jesus estava de fato esquecido em muitos corações, nos quais, por sua graça e por intermédio de São Francisco, ele ressuscitou e deixou a marca de sua lembrança. 
9 Quando terminou a vigília solene, todos voltaram contentes para casa.

 

87. 
1 Guardaram a palha usada no presépio para que o Senhor curasse os animais, da mesma maneira que tinha multiplicado sua santa misericórdia. 
2 De fato, muitos animais que padeciam das mais diversas doenças naquela região comeram daquela palha e ficaram curados. 
3 Mais: mulheres com partos longos e difíceis tiveram um resultado feliz colocando sobre si mesmas um pouco desse feno. Da mesma sorte, muitos homens e mulheres conseguiram a cura das mais variadas doenças. 
4 O presépio foi consagrado a um templo do Senhor e no próprio lugar da manjedoura construíram um altar em honra de nosso pai São Francisco e dedicaram uma igreja, para que, 
5 onde os animais já tinham comido o feno, passassem os homens a se alimentar, para salvação do corpo e da alma, com a carne do cordeiro imaculado e incontaminado, Jesus Cristo nosso Senhor, 
6 que se ofereceu por nós com todo o seu inefável amor e vive com o Pai e o Espírito Santo eternamente glorioso por todos os séculos dos séculos. Amém. Aleluia, Aleluia. 
Termina aqui o primeiro livro da vida e atos de São Francisco.