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Capítulo LV

Texto Original

Caput LV

De fr. Simone de Assisio et mirabili vita eius.

 

1 In principio nostri Ordinis, cum adhuc s. Franciscus viveret, venit ad Ordinem quidam iuvenis de Assisio, qui vocatus fuerat fr. Simon. Hunc tanta gratia benedictionis et dulcedinis prevenit (cfr. Ps 20,4) Altissimus et ad tantam contemplationem et elevationem mentis adduxit, quod tota vita ipsius erat speculum sanctitatis.
Sicut audivi ab illis qui diu secum morati sunt, hic rarissime extra suam cellam videbatur; si quando staret cum fratribus, semper erat sollicitus se in divinis eloquiis exercere. 3 Hic nunquam grammaticam didicit, sed semper conversabatur in silvis; et tamen tam profunde et alte loquebatur de Deo et de amore Cristi benedicti, quod verba eius supernaturalia videbantur. 4 Unde quodam sero, cum in silva ad loquendum de Deo cum fr. Iacobo de Massa perrexisset, et ipsi de divino amore dulcissime loquerentur, ut narravit michi ille qui secum fuit, per totam noctem consederent; et visum fuit eis quod modicum consedissent.
5 Hic fr. Simon tanta suavitate Spiritus sancti fruebatur quod, quando divinas illuminationes et visitationes presentiebat amoris, ponebat se in lecto ac si vellet dormire, quia s. Spiritus tranquilla suavitas non solum mentis quietem sed etiam corporis requirebat. Unde sepe in talibus visitationibus rapiebatur in Deum et totus ad exteriora insensibilis reddebatur. 7 Accidit enim quadam vice quod, dum esset ad celestia tractus et totus insensibilis factus ad extra, intus vero totus divinis carismatibus ignitus et unctus, unus frater, ut experiretur pro certo an, ut videbatur, sic esset, posuit carbonem bene ignitum super nudum pedem ipsius. Frater vero Simon nichil de carbone persensit et, quod plus est, nullam passus est lesionem, cum tam diu super pedem stetit ille carbo, donec extingueretur totaliter. Quando hic ad mensam residebat cum fratribus, antequam cibum sumeret corporis, alimenta spiritualia sociis exhibebat.
9 Unde accidit semel, cum de Deo loqueretur, conversus fuit ad Dominum quidam vanissimus iuvenis de S. Severino, qui fuerat in seculo nobilis et delicatus et valde lascivus; cuius vestimenta ipse fr. Simon, exuta reponens et habitum religionis dicto iuveni tribuens, conservabat. Ipse autem iuvenis moram faciebat cum eo, ut informaretur ab ipso.
10 Adversarius autem noster diabolus, qui omne bonum impedire conatur, tanquam leo rugiens (cfr. 1Pet 5,8) in predictum iuvenem irruit et alitu suo maligno, quo prunas ardere facit, tam ardentes in eo carnis stimulos excitavit, quod ipse iuvenis nullo modo confidebat temptationi resistere. Unde accedens ad fr. Simonem, dixit: 11 “Redde michi pannos quos de seculo attuli, quia temptationis angustias amplius sustinere non valeo”. Fr. autem Simon, compatiens illi, dicebat: “Sede, fili, aliquantulum mecum”. Et dum fr. Simon divina eloquia auribus dicti iuvenis distillaret, omnem illius temptationis angustiam auferebat; et hec pannorum repetitio et temptationis fugatio pluries facta est. 12 Cum autem quadam nocte temptationis violentia plus solito perurgeret, ivit ille ad fr. Simonem et ait: “Penitus michi pannos restitue, quia nullo modo amplius possum stare!”. Ipse autem pius pater, valde illi compatiens, dixit: “Veni, fili, et sede aliquantulum mecum”. 13 Qui accedens totus angustiatus et sedens iuxta fr. Simonem, caput suum in pectore fr. Simonis reclinavit. Fr. autem Simon, illi valde compatiens, elevatis oculis in celum (cfr. Luc 6,20; Ioa 17,1)orans devotissime et cum compassione pro iuvene, raptus fuit ad Deum et etiam exauditus. 
14 Et dum a raptu fr. Simon rediret, iuvenis ille a temptatione sua fuit totaliter liberatus, ac si nunquam sensisset, et, ardore noxio in ardorem s. Spiritus commutato, totus ardebat in Deum, eo quod adherens ignito carboni, scilicet fr. Simoni, totus extitit in Domino reaccensus. 15 Unde tunc temporis, cum captus esset quidam maleficus cuius debebant ambo oculi erui, audactus dictus iuvenis in fervore spiritus ad rectorem accessit in pleno consilio et cum multis lacrimis et precibus petiit ut hanc sibi gratiam faceret quod unus oculus extraheretur sibi et alius remaneret sibi. 16 Illi autem, videntes iuvenis pietatem et ferventissimam caritatem pepercerunt utrique. Hunc autem iuvenem sanctissimum ego oculata fide conspexi.
17 Predicto insuper fr. Simoni, dum quadam die staret in silva et sentiret maximam suavitatem de Domino, aves que gaulle vocantur pre rumore maximo et stridore impedimentum maximum impendebant. Qui in nomine D. Ihesu precepit eisdem avibus quod illuc ulterius non venirent.
18 Mirabile dictu! cum locus ille Brunfortii, Firmane custodie, stetisset ultra quinquaginta annos, nunquam tales aves vise vel audite sunt in toto loci circuitu et undique a remotis; et ego fr. Hugolinus de Monte S. Marie, steti ibidem tribus annis et vidi certitudinaliter dictum miraculum notum tam secularibus quam fratribus totius dicte custodie.
Ad laudem D.n. Ihesu Cristi. Amen.

Texto Traduzido

Caput LV

Frei Simão de Assis e sua vida admirável.

 

1 No princípio de nossa Ordem, quando São Francisco ainda vivia, veio à Ordem um moço de Assis que foi chamado Frei Si­mão. O Altíssimo dotou-o de com tanta graça de bên­ção de doçura (cfr. Sl 20,4) e conduziu-o a tão grande contemplação e elevação da mente que toda a vida dele era um espelho de santi­dade.
2 Conforme ouvi daqueles que moraram com ele durante muito tempo, ele muito raramente era visto fora de sua cela; se al­guma vez estava com os irmãos, era sempre solícito em exerci­tar-se nas palavras divinas. 3 Ele nunca aprendeu a gramática, mas sempre vivia nos bos­ques; e, no entanto, falava tão profunda e sublimemente de Deus e do amor de Cristo bendito que as suas palavras pareciam sobre­naturais. 4 Por isso, certa tarde, tendo ido ao bosque para falar de Deus com Frei Tiago de Massa, falaram muito suavemente do amor divino, como me contou aquele que esteve com ele. Estiveram sentados juntos durante toda a noite; e pareceu-lhes que tivessem estado sentados juntos pouco tempo.
5 Esse Frei Simão fruía de tanta suavidade do Espírito Santo que, quando pressentia as divinas iluminações e visitas do amor, punha-se no leito como se quisesse dormir, porque a serena suavidade do Espírito Santo requeria não só a quietude da mente, mas também a do corpo. Por isso, muitas vezes, em tais visitações era arrebatado em Deus e se tornava totalmente insensível às coi­sas exteriores. Aconteceu, pois, certa vez que, atraído para as coisas celestes e feito todo insensível às coisas exteriores - interiormente, no entanto, todo incendiado e ungi­do pelos carismas divinos -, um irmão, para ter certeza de que, como parecia, ele estava assim, pôs-lhe sobre o pé nu uma brasa bem acesa. 8 Frei Simão nem sentiu a brasa e, além disso, não sofreu nenhuma lesão, apesar de que a brasa tenha estado tanto tempo sobre o pé até se apagar toda. Quando ele se sen­tava à mesa com os frades, antes de tomar o alimento do corpo, oferecia aos companheiros alimentos espirituais.
9 Assim, aconteceu uma vez que, falando de Deus, converteu-se ao Senhor um jovem muito frívolo de San Severino, que fora no mundo nobre, delicado e muito lascivo; o próprio Frei Simão guardava as vestes que ele tirara e lhe dera o hábito da religião. E o jovem morava com ele para ser por ele formado.
10 No entanto, nosso adversário, o diabo, que se esforça por impedir todo bem, como leão a rugir (cf. 1Pd 5,8), precipitou-se contra o jovem e com seu hálito ma­ligno, com o qual faz arder brasas, excitou nele tão ardentes estímu­los da carne que o jovem não tinha nenhuma esperança de resistir à tentação. Então, foi a Frei Simão e disse: 11 “Devol­ve-me as roupas que eu trouxe do século, porque não sou mais capaz de suportar as angústias da tentação”. Mas Frei Simão, compade­cendo-se dele, disse: “Filho, senta-te um pouquinho comigo”. E enquanto Frei Simão instilava as palavras divinas nos ouvidos do jovem, tirava toda a angústia daquela tentação; e isso de pe­dir de novo as roupas e afugentar a tentação aconteceu muitas ve­zes. 12 Mas, como uma noite a violência da tentação urgisse mais do que costumava, ele foi a Frei Simão e disse: “Restitue-me de uma vez as roupas, porque não posso mais permanecer de modo algum!” Então, o piedoso pai, compadecendo-se muito dele, disse: “Vem, filho, e senta-te um pouquinho comigo”. 13 Ele, aproximan­do-se todo angustiado e sentando-se perto de Frei Simão, reclinou sua cabeça no peito de Frei Simão. E Frei Simão, compadecen­do-se muito dele, elevando os olhos para o céu (cf. Lc 6,20; Jo 17,1), orando com muita devoção compaixão pelo moço, foi arrebatado a Deus e foi também atendido.
14 E, quando Frei Simão voltou do arrebatamento, o moço ficou totalmente li­bertado da.tentação, como se nunca a tivesse sentido; e, trans­formado o ardor nocivo em ardor do Espírito Santo, ardia todo em Deus porque, aderindo à brasa acesa, Frei Si­mão, ficou todo reaceso no Senhor. 15 Por isso, naquela ocasião, quando. foi capturado um malfeitor a quem deviam arrancar os dois olhos, o predito jovem, encorajado no fervor do espírito, aproximou-se do diretor, em pleno conselho, e pediu com muitas lágrimas e preces que lhe concedesse esta graça: que lhe fosse arran­cado um olho, e o. outro ficasse para ele. 16 E eles, ven­do a piedade e tão fervorosa caridade do jovem, pouparam a am­bos. Eu fui testemunha ocular desse jovem santíssimo.
17 Além disso, num dia em que o referido Frei Simão estava no bosque e sentindo a maior suavidade de Deus, os pássaros que chamam de gralhas causavam o maior impedimento por causa do grande barulho e estridor. Ele, em nome do Se­nhor Jesus, ordenou àquelas aves que não voltassem mais ali.
18 Coisa admirável! Ainda que o lugar de Brun­forte, na custódia de Fermo, tivesse existido por mais de cinqüenta anos, nunca essas aves foram vistas ou ouvidas em todos os arredores do lugar e por toda parte mais longe; e eu, Frei Hugolino do Monte de Santa Maria, estive aí três anos e vi com toda certeza o dito milagre, conhecido tanto pelos seculares quanto pelos irmãos de toda a custódia.
Para o louvor de Nosso Senhor Jesus Cristo. Amém.