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Introdução às Admoestações de São Francisco

Publicado por Frei Edson Matias | 31/03/2015 - 08:04

Comentar as Admoestações de Francisco de Assis é o propósito desse trabalho de ‘garimpo’. Tal será feito tendo como chave uma leitura espiritual das Fontes Franciscanas. Como toda leitura desse porte, está a mercê de ressignificações e está sempre em construção, pois a própria dinâmica de amadurecimento humano-espiritual deve estar dentro dessa jovialidade: ser capaz de revisitar. É como um aprofundar em espiral. Por vezes passando no mesmo ponto de forma diferente.

Fazer uma introdução às Admoestações se faz necessária para uma melhor compreensão. Visto que já temos algumas bem significativas, como de Frei José Carlos Pedroso, como também dos tradutores da Edição Santo Antônio das Fontes Franciscanas. Tomei a liberdade de transcrever esta última aqui, na integra. Já que ela cumpre de forma modelar o objetivo desse trabalho. Vamos a ela:

“Sobre esse título, encontramos 28 pequenos escritos, redigidos e recolhidos, não se sabe bem ainda por quem, nem onde e nem quando. Os franciscanólogos, como Esser, porém não duvidam de que na origem dessas pequenas pérolas da Espiritualidade Franciscanas esteja a pessoa de Francisco. Mas, como teriam surgido esses opúsculos? Qual seria sua natureza e suas características? Qual sua importância para a Espiritualidade Franciscana? Talvez se possa dizer que as Admoestações são pequenas sínteses ou resumos das intervenções de Francisco nos famosos Capítulos de Pentecostes. Era aí, nesses encontros de toda a fraternidade, que o seráfico pai dava suas orientações e fazia suas exortações, como observam muito bem suas Legendas.

Uma vez que o âmago desta Regra e desta Vida é o Seguimento de Jesus Cristo, vivendo em obediência, em castidade e sem próprio, não é de se estranhar que todos esses textos, quase sempre, iniciem ou tenham como ponto de partida um dito do Evangelho. Diz o Senhor, é o princípio de quase todas as Admoestações. Igualmente, não é de estanhar que a grande preocupação, que perpassa todas elas, seja a de que os Irmãos mantenham o coração livre de toda e qualquer apropriação: libertos e expropriados de coisas e de si mesmos; de todo o tipo de poder ou autoridade; do próprio bem que o Senhor opera e faz por meio de cada um; do pecado dos Irmãos e da vanglória ao anunciar a própria palavra de Deus.

A partir da XIV Admoestação, excetuando-se a penúltima, todas iniciam com um Bem-aventurado, e refletem os temas fundamentais das Bem-aventuranças evangélicas. Dai o costume, também, de identifica-las como As Bem-aventuranças franciscanas.

A natureza e a importância desses opúsculos podem ser percebidas partindo do significado da própria palavra admoestação.

Os termos admoestação, ou admoestar, vêm do verbo latino admoneo que, entre outras coisas, significa fazer pensar, recordar, chamar a atenção sobre, advertir, convidar, convocar, animar, fortalecer, alguém na busca de seu projeto de vida. Como se trata de uma fala de Irmãos para Irmãos, isto é, de seguidores para seguidores de Jesus Cristo, as Admoestações sempre revelam a tonalidade de uma profunda corresponsabilidade e mútua pertença.

Na verdade, admoestar ou ser admoestado, como faz Francisco aos seus Irmãos, só é possível porque há entre eles o profundo e claro sentimento de uma comunhão afetiva e efetiva que brota da convocação comum e anterior a todos. Por isso, todos sentem-se responsáveis por um e mesmo mandato divino.

Portanto, podemos dizer que as Admoestações são apelos, convites e animações que Francisco faz e dirige aos Irmãos, a partir do profundo toque da inspiração originária e comum a todos. Por isso, as Admoestações sempre se revestem de uma tonalidade muito fraterna, paternal, forte e insistente. Seu objetivo é ajudar aos Irmãos a se manterem fiéis à convocação comum que vem da inspiração originária da Ordem.

Consequentemente, o segredo da leitura das Admoestações está na fidelidade à afeição do mistério do encontro e do Amor do Deus de Nosso Senhor Jesus Cristo com o próprio leitor. Segundo as características e as exigências de tal fidelidade e vida.

Diante do Deus-Amor, tão apaixonado por nós, seus filhos, Francisco não cessa de conclamar-nos para que imitemos a Jesus e reconheçamos a boa aventura de sua Encarnação-Paixão e Morte de cruz que Ele nos mereceu. Por isso, expressões como: Vejamos e creiamos firmemente... bem-aventurados... perpassam quase todos esses pequeninos textos: as Admoestações de São Francisco. (Dos tradutores. Editora Mensageiro Santo Antônio, 2005, p. 87-88).

Aqui nesta introdução já deparamos como o modo de refletir franciscano. Vemos que o entendimento das Admoestações só é capitado por aqueles, na ação do Espírito, que estão no discipulado: no seguimento de Jesus Cristo. Ele é o princípio e Fonte. Estar nesse caminho é adentrar nas Bem-aventuranças. Vimos que as Admoestações, muito além de somente chamar atenção, é uma voz que surge lá do meio do ‘Caminho’, do ‘discípulo engajado’. Fala-se de dentro, do movente vigoroso da graça e da resposta.

Pensemos bem: se são falas de Francisco de Assis ou mesmo algumas compilações delas, feitas por outros durante os capítulos dos frades, imaginemos que riqueza temos perante nós, em nossas mão. Não simplesmente por que foram ditas pelo homem Francisco, mas são palavras, ‘orientações’, ‘admoestações’ realizadas na própria Fonte do Mistério que moveu o pobrezinho de Assis. Olhando-A e observando a resposta do discípulo temos diante de nós os ‘sinais’, as ‘setas’ e as possíveis sendas que se descortinam diante de nós. Estudar, meditar, garimpar tais vestígios é nos possibilitar adentrar na ‘corrente’, no ‘rio’ dessa graça que passa bem ai pertinho de nós.

Com tal espírito recorramos a estas fontes para que possamos alimentar nossa vida na verdadeira Vida que germinou em Francisco e em seus primeiros companheiros. Vamos a ‘Obra’. Que o Espírito seja nosso guia. Amém.

 

REFERENCIAS

 

FONTES FRANCISCANAS. Santo Andre/SP: Editora Mensageiro de Santo Antônio. 2005. 

Sobre o autor
Frei Edson Matias

Frade Capuchinho, Sacertode. Naceu no ano de 1976 em Anápolis-GO. Filho de Baltazar Justino Dias e Genoveva Matias Dias. Ingressou na Ordem Franciscana em 25 de Janeiro de 1999, inicialmente nos Frades Conventuais - Província de Brasília. Depois fez a passagem para a Ordem dos Frades Menores Capuchinhos no dia 13 de Julho de 2009. 

Formação

Doutorando em Teologia na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia - FAJE. Psicólogo pelo Centro Universitário de Brasilia - UniCEUB. Mestre em Ciências da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás - PUC Goiás. Pós-Graduado em Psicologia Junguiana pela Faculdade de Ciências da Saúde de São Paulo - FACIS. Pós-Graduado em Teologia Contemporânea pelo Centro Universitário Claretiano. Teólogo Pelo Centro Universitário Claretiano. 

Áreas de atuação

Foi Professor de Psicologia e disciplinas afins na Filosofia e Teologia nos Institutos: ISB/DF, ITEO/MS e IFITEG/GO e na Faculdade Brasil Central/GO. Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Psicologia clínica e psicologia da religião, como também em Teologia Pastoral e Espiritualidade. Presta assessorias às comunidades e congregações religiosas. 

Livros e Artigos

Possue diversos artigos publicados em revistas e livros. 

Contato

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