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Homilia Dominical / Frei João Santiago

Publicado por Frei João de Araújo Santiago | 10/12/2016 - 17:34

III Domingo Advento 

Mateus 11, 2-11

“Em tua luz veremos a luz”

 

João Batista ... mandou os seus discípulos perguntarem a Jesus: «És Tu Aquele que há de vir ou devemos esperar outro?» Jesus respondeu-lhes: «Ide contar a João o que vedes e ouvis: os cegos veem, os coxos andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e a boa nova é anunciada aos pobres. .... 

No tempo de João Batista o povo de Deus andava um pouco desacreditado no sentido que imaginavam as “portas” do céu fechadas, como se Deus tivesse se “calado”. Nenhuma novidade, nenhuma esperança. No entanto havia um anseio, pois afinal os profetas tinham dito coisas maravilhosas, tais como: o lobo será hospede do cordeiro, a pantera se deitará ao pé do cabrito, o touro e o leão comerão juntos, o leão comerá palha com o boi. (cf. Isaias 11). Tais coisas maravilhosas parecem coisas impossíveis: começar uma vida nova, reinventar a vida, largar taras, vícios, maus costumes, conseguir uma reconciliação, plasmar uma comunidade e cidade mais justa e pacífica, viver sem tanta angústia pelo amanhã incerto, etc. São Paulo usou palavras fortes: “Quem me livrará desse corpo de morte? Sinto-me um ser dividido: de uma lado o que não quero, faço, e de outro, o que quero de bom termino não fazendo”. E, assim, caminham os homens e mulheres buscando um sentido maior, um empreendimento, uma maior maravilha na vida, uma realização mais plena e uma alegria mais contagiante. Anseio!

Hoje é o domingo da alegria no caminho do nosso advento, da nossa espera. Por quê? Porque temos uma bela notícia: o Messias se apresentou, vem de encontro ao nosso anseio. É o nosso redentor. 

 

Com Ele os cegos veem. Infelizmente só depois de muito tempo, às vezes anos, é que nos damos conta de quanto cegos estávamos ao fazer, dizer, pensar certas coisas. Quando somos cegos tendemos a nos ferir, tombar, cair, e esbarrando nos outros ferimos também os demais. O nosso Messias nos faz enxergar a beleza da natureza, as lágrimas dos nossos queridos, o olhar dos que nos rodeiam, a dor dos familiares, o próprio filho quando brinca ou dorme, a beleza dos seres humanos e também das coisas. Faz-nos perceber o quanto estamos estagnados, o quanto colocamos a culpa nos outros e o quanto semeamos discórdias. 

Jesus disse: “Quem me segue não andará nas trevas, terá a luz da vida”. Que promessa pretensiosa! É.... Jesus tinha as suas pretensões. É demais prometer a luz da vida, pois se trata de ter em mãos, “apalpando”, o significado maior de ter vindo ao mundo, o sentido do que fazer nestes anos de vida e quais atitudes tomar no dia-a-dia. Ter a luz da vida é ter esperança no vindouro amanhã e a segurança do sentido, pois Deus mantem a palavra, é fiel. 

Com Ele os coxos andam. Deixemos de ser “coxos, isto é, pessoas que vivem de subterfúgios (desculpas, pretextos, estratagemas, artifícios, artimanhas, fugas, evasivas, escapatórias, tramoias, simulações). Passemos a viver na verdade, na direção certa, na honestidade de vida. O Evangelho nos fala de superação: andemos a passos largos, saiamos de um mero caminhar lento e preguiçoso. Somos capazes de grandes coisas! Não enterremos nossos bons sonhos. Afinal, o Evangelho está profetizando que longos passos podem dar ser dados na vida. Muitas descobertas e tantas coisas interessantes a Palavra de Jesus promete. Infelizmente podemos preferir ficar paralisados, imobilizados, ancorados, fixados em nossa mesquinhez e assim decretamos nossa morte espiritual. O que sei, faço e sou hoje em dia não pode me bastar. Nossa estatura é outra: “... até atingirmos o estado de homem feito, a estatura da maturidade de Cristo” (Ef 4, 13).

Com Ele os leprosos são curados. Será possível sanar o ser humano? A lepra é uma enfermidade na pele. Tem muitos significados. O leprosso expressa o ser humano violento e agressivo do qual devemos manter distância. O leproso, ele mesmo, tem vergonha de si, se considera incapaz. Apresenta-se feio e repugnante. Não é por acaso que se desprezam e são desprezados. É a falência do amor e ao mesmo tempo o anseio por amar e ser amado. O leproso lembra a praga do pecado e até onde o pecado pode reduzir um ser humano. Pois é! Por mais desgraçada e miserável que seja a situação degradante de um ser humano, o nosso Messias sana, restaura. Que responsabilidade para nós que prometemos seguir os passos de Jesus. Isso mesmo! É a comunidade cristã que hoje é chamada a realizar tais façanhas que só o Espirito do Messias ressucitado pode realizar. 

 Com Ele os surdos ouvem. O nosso Messias tem em seu programa de vida abater o orgulho, a soberda, o narcisismo, o egoísmo. Há, sim, infelizmente uma surdez que nos impossibilita uma saída de si, e assim ficamos incapazes, atrofiados, surdos aos apelos do Espirito do Senhor, aos apelos da vida e dos acontecimentos, aos apelos dos nossos queridos. E assim ficamos presos e escravos dos nossos próprios pensamentos, ponderações e juízos. 

Agente quase não lembra, mas o primeiro e grande mandamento é “Escuta, Israel, o Senhor é o único Deus”, como que dizendo: “Tu, lembra-te, não és Deus, não podes dispor da tua vida e da vida e dos bens dos outros ao teu bel-prazer”. Mas  corremos, sim, o perigo de vivermos tapados. Até quanto podemos escutar? Toda a verdade? Até quando vou abafar e não querer saber?

Imaginemos um surdo que depois de 30 anos ouve o primeiro som de sua vida. Imaginemos agora quanta maravilha e libertação sentiremos quando descobrirmos que há outro ponto de vista e não só o nosso, que há uma saída que não sabíamos, que o inocente era culpado e que o culpado era o inocente, etc.

Escutemos o gemido de quem sofre ao nosso lado, o gemido do nosso interior. Escutar é dar-se conta do que se diz e faz e se faz bem ou mal, ajuda ou fere, faz viver ou morrer.

 

Com Ele os mortos ressuscitam. Os cegos que veem, os coxos que andam, os leprosos que são curados, os surdos que ouvem: todos sinais de ressurreição. Tais sinais são mostras de que temos precisão um do outro, pois não saímos do atoleiro sozinhos. É na comunidade do Messias Jesus que tais sinais acontecem. Que passemos a “trocar” nossos dons, um ajudando o outro, e que eu e você não sejamos “mortos-vivos”.

 

Com Ele a boa nova é anunciada aos pobres. Não te esqueças, não te desanimes: também para ti tem uma salvação.

Havia um homem que se dizia cristão. Um amigo lhe perguntou: “Já leste a Biblia?”.   “Não!”   “Rezas sempre?”   “Infelizmente, às vezes”.   “E a confissão?”   “Raramente”.   “Afinal, que raça de católico és?”   “Olha, antes eu gastava meu dinheiro em bebdeiras, falava besteira, e espraguejava a todos e o mundo inteiro. Os meus filhos viviam amedrontados comigo e minha mulher preferia eu fora do que dentro de casa. Um dia o Senhor me fez entender que gostava de mim. Daquele dia em diante eu mudei: tenho mais compromisso no trabalho, não gasto mais o dinheiro em farras, presto voluntariado junto a crianças sem teto e os meus filhos e esposa não veem a  hora de eu voltar para casa”.

Sobre o autor
Frei João de Araújo Santiago

Frade Capuchinho, da Província Nossa Senhora do Carmo. Licenciado em Filosofia, Bacharel em Teologia e Mestre em Teologia Espiritual. Tem longa experiência como professor, seja no Brasil, como na África, quando esteve como missionário. Por vários anos foi formador seja no Postulantado, como no Pós Noviciado de Filosofia. Atualmente mora em Açailândia-MA. Já escreveu vários livros e muitos artigos.